A mão do cabelereiro tremia. Alguns minutos e cabelos no chão ele voltou a comentar comigo sobre sua boa relação com a mãe de seu filho mais novo, como havia feito com o cliente anterior. A risada era doída, desconfortável, após cada frase sobre o assunto. Sorri, disse que o que importava mesmo era o carinho pela mulher que deu a ele seu maior presente. E vice versa. - É verdade, é verdade. O menino havia trocado de escola 3 vezes, mas se encontrou em uma do ramo religioso. Nem recuperação pegou. Não disse a ele que eu fui o rei da recuperação. Mas contei do encanto pelo bairro preferido dele em SP. Se pudesse, voltava, mas o orçamento não permite. 500 mil num apto pequeno de 2 quartos? Deve ser muito mais. O corte custava 50. Não tinha o dinheiro, ele fez por menos.
Resmungos
domingo, 21 de fevereiro de 2016
segunda-feira, 17 de agosto de 2015
segunda-feira, 3 de agosto de 2015
Exercício de um poema
Um pé na frente
do outro.
O início de uma
fila.
Olhe para frente,
conte até onze.
Feche os olhos e solte
as mãos.
Troque os pés.
Equilibre-se.
domingo, 12 de julho de 2015
terça-feira, 5 de março de 2013
Cavernas de Bhaja e Karla
Antes
de cair de cama, quando o organismo se revoltou com o tempero
indiano, fui para fora de Pune. Uma hora de estrada, em direção a
Mumbai, fui até Bhaja e Karla caves. Meu último passeio turístico
histórico religioso. Em Karli, as cavernas de Bhaja recebiam a
visita de apenas um casal de turistas. O lugar, um grupo de comôdos
ao redor de um grande templo de teto arredondado usado para rituais
religiosos, é protegido por uma portão frágil e cercas cheias de
furos. Segundo historiadores, Bhaja teve sua importância cultural e
religiosa na rota comercial entre o sul e o norte da India no segundo
século AC. Dentro das cavernas pode-se ver inscrições e desenhos.
Religião
e comércio não deixam as cavernas de Karla vazias. Em volta da
escadaria que leva a um dos mais antigos templos budistas, do Século
2 AC, barracas se amontoam. Mendigos se apóiam nas muretas e chamam
com as mãos esticadas.
Uma banda tinha fôlego e a cada degrau
aumentava o volume dos tambores e metais. A turma dançava. Um templo
semelhante ao de Bhaja, mas ainda maior, tem em sua entrada,
esculturas de elefantes, casais e mulheres peitudas dançando. Nas colunas, novas mulheres sentadas em elefantes. Ao
lado, cavernas são alvo de mijo e depredação.
EmPune
Pune
é cidade grande. Vizinha à imensa Mumbai uns 200km. Lugar de
investimentos. Empresas de Tecnologia da Informação indústrias
multinacionais, Shopping Centers e Universidades. Em uma volta pelos
arredores é possível ver dezenas de quilômetros de quarteirões de
prédios em construção. Alguns minutos de estrada e os prédios são
substituídos por condomínios fechados com nomes acabados em Garden,
Golden, Park...
Tem
grande concentração de moradores estrangeiros. Os turistas também
chegam. Prova disso é a quantidade de hotéis estrelados em forma de
arranha-céus ou prédios de desenhos arredondados e cores metálicas.
Como quase toda cidade indiana, o turismo religioso também é carro
chefe, mas em Pune ele tem outro estilo. Não são tendas no meio do
mato, em terrenos baldios, sem banheiros, lama e poeira de brinde.
Em
um dos bairros nobres da cidade, Koreagon Park, um grupo de ruas que
se parece com o jardim Europa com residências parecidas com as do
Alto da Boa Vista, está o Osho International. Não é um Ashram, não
é um hotel. É um resort que ocupa centenas de metros arborizados do
bairro, protegidos por cercas de mabu pintadas de preto e guaritas
com policiais, daquelas parecidas com as do Jardim Europa, que tiram
a calçada dos pedestres. Para uma visita de algumas horas, com
direito a participar da meditação, cobra-se 20 euros. O visitante
ainda tem que entrar com uma roupa cor vinho, que eles vendem por 10
euros, mas no camelô na esquina da rua, sai por 3 euros. “Mas não
tem a mesma qualidade”, diz o francês mal humorado, na portaria com placas de
mármore preto.
Nas
ruas, porsches e carros japoneses dividem espaço com búfalos que
param o trânsito em um desfile que poucos dão atencão. Pelas ruas
os casais andam de mão dadas, arriscam abraços e beijos, sem causar
espanto alheio. As mulheres combinam calças jeans apertadas e ombros
de fora com rostos cobertos. Entre os jovens, o hindi perde espaço
para o inglês e as lojas de fast food tomam espaço das barracas de
samosa e parantha. O progresso do oeste não costuma das brechas.
Entre os prédios novos e envidraçados, casas de madeira da tradicional arquitetura indiana aparecem carcomidas nas ruas transversais, onde a terra retoma espaço do asfalto, as crianças gritam em frente à mesquita e alguns olham curiosos para o turista com uma máquina fotográfica nas mãos.
No trem
Quase
três horas da manhã. Já cochilei na sala de espera e agora encosto
minhas malas no chão cuspido da estação de Mhugal Sarai, uns quase
30 quilometros de Varanasi. O trem está marcado para essa hora, essa
plataforma, mas não aparece. Resmungo e olho para duas plataformas à
frente. Ele está lá. E falta muito pouco para partir. Corro igual
um maluco, junto com mais um trio repleto de caixas de papelão.
Atravesso a passarela e ainda na corrida, pergunto para um moleque
onde está o vagão B1.
Estou
na classe AC 3 (ar condicionado 3a classe) pela primeira vez. Tudo
escuro e silencioso, as cortinas estão fechadas e tenho que ir
abrindo uma a uma para achar minha cama. Torço por uma cabine ainda
vazia, mas a minha está cheia. Só a cama vaga. Divido ela com a
mochila e durmo. Do lado, um grandalhão ronca vertiginosamente.
Lembro do Berna em Londres. Seriam 24h de viagem.
Acordo
10h com Rainbow Country. Na sequência, Soul Rebel, Sun is Shining,
Revolution e Hammer. O dia começava bem, mas fiquei sem saber de
onde vinha a música. Entre uma espreguiçada e outra, reparava nos
meus compenheiros de viagem. A impressão era de serem quatro irmãos,
dois homens, que pareciam Sikhis, com um pano preto amarrado na
cabeça, e duas meninas. Um deles carregava um punhal na cintura, com
cabo de marfim.
O
outro integrante estava na cama alta, do meu lado. Trabalha na Indian
Railways, é responsável por uma pequena estação em Karnatka,
soube quando já estava de pé e com cama perdida. Durante o dia, as
camas debaixo viram bancos para todos na cabine. As camas do meio são
fechadas. Só as de cima sobrevivem. O lugar era apertado para tanta
gente e mala. Cada movimento ou ida ao banheiro exigiam
planejamentos, perguntas e respostas. Foi aí que pedi ao cara da
cama de cima para trocarmos de lugar. Até agora não sei se ele
aceitou só por educação com forasteiros, ou não. Mas fui para
cama de cima feliz da vida.
Peguei
algumas frutas e um croissant que havia comprado em Varanasi e fui
comer em outro lugar, perto dos cheirosos banheiros, em uma das
paradas.
Ele
voltou a se mexer e logo ganhou velocidade. Abri a porta do trem, o
vento logo soprou forte na minha cara. O dia era bonito, de sol e
paisagens rurais. Sentei na escada, coloquei os pés para fora, como
os vagabundos faziam nos vagões de carga.
O trem passou por uma
ponte de ferro. Ouvi um longo rangido, a água verde do rio logo
abaixo dos meus tênis. Voltamos para terra, os vilarejos de casas de
barro, pequenos templos em meio às plantações, os morros verdes e
amarelados ao fundo, meio esfumaçados pela poeira, alguns riacos de
leito seco. O trem deslizava por junções de trilhos, a fumaça
preta com cheiro de curry e a buzina grave, comprida. Estava a caminho de Pune.
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