Faço
as refeições todos os dias no Honeyfall, um restaurante com telhado
de folhas de coqueiros e bambu. Desenhos nas paredes: peixes, olhos
coloridos, um coração escrito Puri dentro, como tatuagem antiga. A
comida e o preço honestos. O dono me deixa dever por algumas horas e
também me deve, certas vezes. Mas a conta fica sempre acertada. Fica
numa esquina da rua do hotel. É ponto certo de alguns outros
turistas, locais e gringos. Forma-se uma familiaridade entre os
clientes.
Um casal de coroas franceses. Ela com a voz bem fina e ele
com um chapéu de pescador. Duas indianas, uma com o cabelo bem curto
e outra de cabelos castanhos. Sempre cheias de sorrisos. Um
argentino, que abandonou o trabalho de contabilidade que tinha com o
pai. Está viajando, meses e meses. Depois da India, Tailândia,
Indonésia. Depois vai pensar no que fazer.
“Quando o dinheiro
acabar.” Um europeu, senhor, que pede o mesmo café da manhã e que
pega o jornal, depois que leio. Toma café, apesar do café indiano
ser muito ruim. Um alemão, de Jena, que não gosta do restaurante,
mas estava ali conversando com o argentino. Depois encontro ele na
praia. Dá aula de yoga na Alemanha. Também faz capoeira angola e
fala português.
Sabe muito sobre a religião hinduista. Vamos
andando em ritmo forte pela praia. Ele faz isso quase o dia todo. “Lá
para o lado da cidade, as energia são ruins.” Fala sobre os
deuses, fala sobre a energia que recebe quando está em contato com a
natureza, fala sobre a alimentação correta, sobre Yoga, capoeira,
meditação, mistura com inglês, fala da Europa que “não possui
boas energias. Só serve para dinheiro”, fala das regras e mais
regras da cultura alemã, fala dos indianos que “sugam as energias
dos outros. Só estabelecem relação a partir de dinheiro”.
Em
alguns momentos, o vento forte do mar não me deixava escutar direito
e era o momento em que tentava absorver algumas daquelas centenas de
informações por segundo. Também fala sobre surfe em Bali, ventos,
pranchas. Ele também procura outro modo de vida. Quer dar aula,
gosta, mas quer fazer isso na Asia, talvez na India, talvez em outro
lugar. “O Sri Lanka, Laos, Vietnan, esses lugares são mais
bonitos, existe muita natureza ainda.”Precisava de um pouco de
silêncio depois de tanto ouvir. Voltei para o hotel, antes, alguns
minutos de observação de ondas.
Na
despedida de Puri tomei coragem para mergulhar no mar de West Bengal,
após bater um papo e ver um tiozão australiano de Melbourne, que
viveu 10 anos na India, pular naquela água gelada e suja. Me contou
que estava no país após mais de 10 anos sem visitas. Veio sozinho e
deixou a mulher triste em casa. Mas ela tinha trabalho e
ele...”pouco trabalhei na minha vida. Tive sorte”, respondeu.
Em
Puri não colocava os pés há mais de 20 anos. Foi para rever
amigos. E quase todos já estavam mortos. Mesmo chateado, disse
compreender. “Muitos deles não levaram uma vida muito saudável,
além de amizades pouco saudáveis também.”
Comemos
umas mexericas e cada um foi para o seu lado. Quando saia da cidade,
caminhando, fui atropelado por uma bicicleta. O ciclista foi para o chão. Todos estavam bem. Andei até a estação de trem e subi no Sri Jagannath Express às 22h30, sentido Kolkata.
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