quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Viajantes, restaurante e atropelos


Faço as refeições todos os dias no Honeyfall, um restaurante com telhado de folhas de coqueiros e bambu. Desenhos nas paredes: peixes, olhos coloridos, um coração escrito Puri dentro, como tatuagem antiga. A comida e o preço honestos. O dono me deixa dever por algumas horas e também me deve, certas vezes. Mas a conta fica sempre acertada. Fica numa esquina da rua do hotel. É ponto certo de alguns outros turistas, locais e gringos. Forma-se uma familiaridade entre os clientes. 


Um casal de coroas franceses. Ela com a voz bem fina e ele com um chapéu de pescador. Duas indianas, uma com o cabelo bem curto e outra de cabelos castanhos. Sempre cheias de sorrisos. Um argentino, que abandonou o trabalho de contabilidade que tinha com o pai. Está viajando, meses e meses. Depois da India, Tailândia, Indonésia. Depois vai pensar no que fazer.

 “Quando o dinheiro acabar.” Um europeu, senhor, que pede o mesmo café da manhã e que pega o jornal, depois que leio. Toma café, apesar do café indiano ser muito ruim. Um alemão, de Jena, que não gosta do restaurante, mas estava ali conversando com o argentino. Depois encontro ele na praia. Dá aula de yoga na Alemanha. Também faz capoeira angola e fala português. 

Sabe muito sobre a religião hinduista. Vamos andando em ritmo forte pela praia. Ele faz isso quase o dia todo. “Lá para o lado da cidade, as energia são ruins.” Fala sobre os deuses, fala sobre a energia que recebe quando está em contato com a natureza, fala sobre a alimentação correta, sobre Yoga, capoeira, meditação, mistura com inglês, fala da Europa que “não possui boas energias. Só serve para dinheiro”, fala das regras e mais regras da cultura alemã, fala dos indianos que “sugam as energias dos outros. Só estabelecem relação a partir de dinheiro”. 

Em alguns momentos, o vento forte do mar não me deixava escutar direito e era o momento em que tentava absorver algumas daquelas centenas de informações por segundo. Também fala sobre surfe em Bali, ventos, pranchas. Ele também procura outro modo de vida. Quer dar aula, gosta, mas quer fazer isso na Asia, talvez na India, talvez em outro lugar. “O Sri Lanka, Laos, Vietnan, esses lugares são mais bonitos, existe muita natureza ainda.”Precisava de um pouco de silêncio depois de tanto ouvir. Voltei para o hotel, antes, alguns minutos de observação de ondas.


Na despedida de Puri tomei coragem para mergulhar no mar de West Bengal, após bater um papo e ver um tiozão australiano de Melbourne, que viveu 10 anos na India, pular naquela água gelada e suja. Me contou que estava no país após mais de 10 anos sem visitas. Veio sozinho e deixou a mulher triste em casa. Mas ela tinha trabalho e ele...”pouco trabalhei na minha vida. Tive sorte”, respondeu.

Em Puri não colocava os pés há mais de 20 anos. Foi para rever amigos. E quase todos já estavam mortos. Mesmo chateado, disse compreender. “Muitos deles não levaram uma vida muito saudável, além de amizades pouco saudáveis também.”


Comemos umas mexericas e cada um foi para o seu lado. Quando saia da cidade, caminhando, fui atropelado por uma bicicleta. O ciclista  foi para o chão. Todos estavam bem. Andei até a estação de trem e subi no Sri Jagannath Express às 22h30, sentido Kolkata.

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