quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Palolem


Thank you, man. Have a nice trip, disse ao descer do trem para o cara que me falou que estávamos em Canacona. Ele acenou e o trem apitou a partiu. Apertei os olhos para enxergar a placa novamente. Estava lá, em Hindi também, Canacona. Com as mochilas no chão, olhei ao redor e vi que apenas duas ou três pessoas haviam descido no mesmo ponto que o meu. E elas já estavam longe. 

Sou completamente leigo em transporte ferroviário, já que esqueceram das ferrovias no Brasil, mas nunca tinha visto pátios de estações tão grandes como os que estava vendo na India. O trem era gigantesco. Comecei a caminhar em direção a estação e o trem, já em movimento, não acabava nunca. Sei lá quantos vagões.

Era mais de meia noite. Uma banquinha de comida e bebida estava aberta na estação. Três caras conversavam. Passei por eles e vi o guichê fechado. Tinha a saída, à direita, com uma escada, e uma sacada. Fui até lá para me localizar. Encontrei alguém dormindo num saco de dormir, num banco. Vi que era viajante. Logo escutei um “Hey, german?” Disse brasileiro. 

Era um jovem austríaco. Estava esperando o trem das 4h30 da manhã para ir embora. Tinha passado 12 dias ali, mais alguns em Bangalore. Logo chegou um indiano e perguntou se eu queria ir para algum lugar. Disse que tinha um lugar reservado em Palolem. Era apenas 3km dali. De rickshaw custava 18 rúpias até lá. Mas era meia noite e meia e o cara me ofereceu por 100 rúpias. Achei a diferença grande, mas o austriaco me lembro do horário e percebi que era a única alternativa, ou ir caminhando e perguntando pelo caminho.

 Falei que tudo bem e o cara me disse. “Mas eu não tenho ricshaw. Tenho uma bike.” Bicicleta, mano (em inglês)? Disse para ele olhar pra mim e para minha mochila maior. Ele disse, tudo bem, sem problema. O cara devia pesar metade de mim. O jovem europeu já lançou: “eles andam até em quatro em bikes, não tem problema uma mochila, ou duas.”Pensei uns segundos. Me despedi do austríaco e fomos embora.

O alívio foi quando descemos as escadas e vi que bike era uma moto. Subimos e em 10 minutos estava em uma das entradas de Palolem. Desci da moto e paguei o cara, que me deixou com outro moleque, que disse saber onde era o meu hut (cabana). Começamos a andar na praia, comércio aberto, música alta (eletrônica), os bares com suas luzes coloridas e europeus, aos montes.

Chegamos a um estabelecimento e fui apresentado a Samy, o gerente do lugar. Disse que tinha uma reserva, mas que havia chegado algumas horas antes. Citei o nome da pessoa com quem havia feito a reserva e ele fazia cara de dúvida. Me mostrou um hut e perguntei se era o meu daquela noite, ou o que tinha reservado para os próximos dias. Dai foi que ele admitiu. “Aqui são os huts do Samy.”

Agradeci e falei que tinha reservado outro e que procurar. Sai andando pela praia, após a tentativa de cambau. Caminhei mais algum tempo e depois de uma indicação e recusar mais algumas ofertas, cheguei ao The Nest. O bar ainda estava movimentado. Me apresentei e logo o gerente veio falar comigo. Confirmou minha reserva e me pediu para aguardar um instante. Momento em que troquei algumas palavras com uma coroa inglesa e bem bêbada, que disse frequentar o local há muitos anos, não entendi quantos.

Mohan, o gerente, me guiou até a cabana. A uns 20 metros da areia, uma casinha de madeira branca, com uma varanda e uma pequena janela. Peguei a chave, agradeci e empurrei as mochilas num cantinho. Estava perfeito.


Dentro, uma cama grande, com mosquiteiro e colchas coloridas. Uma mesinha e uma estante de pano pendurada. Um ventilador no teto de palha. Um banheiro que podia estar em melhores condições, mas funciona. Além da janela, a casinha tem uma centena de “saídas de ar”, principalmente no banheiro e na parte debaixo da parede do quarto, que não chega até o chão.

Tomei um banho e comi um sanduiche de tomate e queijo com uma cerveja. Dormi.
Eram quase 11h quando saí da cama. Precisava de uma internet para avisar que havia chegado. A net no The Nest funciona entre 10h e 22h. Mandei as mensagens e fui tomar um café da manhã...de frente para o mar. Chá, pão de forma com manteiga, ovos e um sucrilhos. E de frente, na cara do mar, com sol, coqueiros e calor.

Antes de voltar para a casinha, comprei protetor solar, repelente e um pano grande, desses de usar na praia. Foi meu primeiro treino de negociação de preço. Consegui um desconto e vi uma cena que ainda não sei se é corriqueira na India. Quem manda no negócio, pelo menos ali, é a mulher. O marido me levou até dentro da loja, pegou a criança no colo e quem assumiu as negociações foi a mãe. Me mostrou vários panos e chegamos a um acordo de valores até o aperto de mãos.

Caminhei até o outro lado da praia, que deve ter meio quilometro. Reparei nos barcos de pesca, coloridos, como no Brasil, com uma diferença, eles possuem um apoio, como se fosse um catamarã, feito por dois troncos levemente retorcidos e mais uma base de madeira. Na areia, o que impera entre turistas europeus e indianos é o frisbe. Entre os indianos, o cricket. Mas também encontrei as turmas praticando o bom e velho esporte bretão. Palolem, assimo como todos os lugares que passei pela India, é dominada por cães vira-latas e corvos, que diferente dos europeus, possuem uma parte acinzentada no dorso.


A praia de água bem calma e quente, tem um local em que só mulheres podem entrar. Só vi indianas utilizando a demarcação. Tirando crianças, não vi mulheres do país usando trajes de banho, mas muitas não usam as roupas características na areia. Goa, pela colonização portuguesa e mais ainda pela alta concentração de turistas europeus, possui um panorama diferente de outros locais da India. O catolicismo ainda é forte, vi algumas igrejas pelo caminho, e a rigidez em relação à vestimentas e o cotidiano feminino, por exemplo, parecem ser mais maleáveis. Mas, por enquanto, também não encontrei as “russas de top less”, como me disseram.

Goa já foi parada obrigatória para hippies. Ainda não vi eles por aqui. O que se mais se houve nas praias é a música eletrônica. Nos bares dos hotéis e na areia. Em uma caminhada observei dois grupos, de europeus, com caixas de som pulsando trance music sem parar. O que chamou a atenção é que o estilo musical, mais contemporâneo, não espanta turistas mais velhos. Pelo contrário. A impressão é a de quem vai a Goa não procura silêncio para relaxar. Festas ocorrem todos os dias em Palolem, ou nas praias vizinhas. Na caminhada que fiz para fotografar, recebi dois convites.


Vi um pôr do sol bonito no canto da praia e conversei com um local, que me ofereceu um passeio de barco pelo rio que desemboca na praia. “Lá você vai poder fotografar aves grandes e pequenas e macacos também, bem de perto”, me disse. Ele disse que o pai dele falava um pouco de português, mas que ele mesmo só sabia “obrigado” e o famoso portunhol “Como estás”. Também falamos de futebol_Pelé e Ronaldo, os que ele conhecia_e cricket. E eu não soube citar o nome de nenhum jogador da India, atual campeã mundial. Ele também queria saber se no Brasl havia dinossauros. Respondi que há milhões de anos, sim, mas que agora nao tínhamos animais tão grandes. Segundo ele (está difícil decorar os indianos), na India, nem no passado remoto houve dinossauros.


Jantei dois sanduiches de tomate com queijo com duas cervejas Kingfisher (acho que é o Martim Pescador), que adotei desde a minha chegada. Ela é produzida em Bangalore, mas, segundo o rótulo, só pode ser vendida em Goa. O fuso horário bateu e fui pra cama.

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